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Humanização no atendimento a mulheres vítimas de violência de gênero no Cabo de Santo Agostinho

Mulher conversa com equipe da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Cabo em uma sala reservada
Mulheres que procuram a unidade são atendidas por equipe multidisciplinar
 
Humanizar o atendimento a mulheres vítimas de violência de gênero, aproximar o Poder Judiciário da população e repensar a atuação de equipes multidisciplinares. Com esses objetivos, a Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (VVDFM) do Cabo de Santo Agostinho – também responsável pelas demandas de Ipojuca, na Região Metropolitana do Recife – implantou um modelo de Audiência de Acolhimento. A iniciativa partiu do juiz Francisco Tojal e tem como base as diretrizes da Campanha Nacional Justiça pela Paz em Casa, idealizada pela ministra do Superior Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia. A unidade conta com o apoio da Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE).
 
Têm acesso ao serviço mulheres que realizaram denúncias e são atendidas por medidas protetivas de urgência, como explica o juiz Francisco Tojal Dantas Matos. "Trata-se de uma ação institucionalizada nas rotinas procedimentais desta unidade judiciária em que, após o ajuizamento de medidas protetivas de urgência, a vítima de violência é convidada a participar de uma audiência sigilosa com profissionais preparados – psicólogo e assistente pessoal – e sensíveis para dar atendimento individualizado e eficaz para as usuárias. Mas não excluídas as possíveis demandas espontâneas existentes de mulheres que nos procuram em busca de orientação", destaca o magistrado.
 
Audiência sendo realizada na Vara de Violência Doméstica e Familiar do Cabo
Juiz Francisco Tojal é o magistrado responsável pela VVDFM da Comarca do Cabo de Santo Agostinho
 
Desde a implantação das Audiências de Acolhimento, em dezembro de 2015, até maio deste ano, 124 vítimas foram atendidas na VVDFM do Cabo dentro do projeto. Com base no perfil dos atendimentos, observa-se que as mulheres têm de 16 a 64 anos de idade e estão em todos os níveis de escolaridade, sendo o maior percentual, de 37%, entre aquelas com ensino fundamental incompleto. Aproximadamente 62% das agredidas matinham relações com o acusado por união estável ou casamento e 66% haviam presenciado atos de violência doméstica na infância ou adolescência. 
 
Os dados ainda atestam que 82% das mulheres se sentiram mais seguras com relação ao deferimento das medidas de proteção. "As medidas protetivas têm uma tramitação processual de natureza cível. Após o ajuizamento, o juiz avalia o deferimento da medida e, em momento posterior, subsequente à defesa por parte do agressor, é realizada a Audiência de Acolhimento. Isso foi pensado, sobretudo, para analisar as consequências da decisão judiciária após o conhecimento do agressor, analisando-se, inclusive, a sua efetividade. Se for noticiado o descumprimento da medida protetiva ou a reiteração de condutas, por exemplo, podem até ser deferidas novas medidas cautelares e, até, decretada a prisão do agressor em momento posterior à elaboração do laudo pela equipe psicossocial", lembra o juiz Francisco Tojal. Após as Audiências de Acolhimento, 89% das vítimas decidiram dar continuidade ao processo.

Parte da equipe da Vara de Violência Doméstica e Familiar do Cabo
Parte dos responsáveis pelo atendimento na unidade judiciária do Cabo
 
A equipe da VVDFM do Cabo de Santo Agostinho é formada por um magistrado, dois assessores, um assistente social, um psicólogo, quatro secretários e três estagiários. Todo pessoal é responsável, entre outras atividades, pela reavaliação acerca do deferimento ou da manutenção de medidas, pelo encaminhamento à rede de apoio e pelo atendimento individualizado e humanizado às vítimas. Nos relatos, entre os tipos de agressões doméstica e familiar sofridas pelas mulheres atendidas durante o acolhimento, 42% se queixaram de violência moral, especialmente por conta de injúria e difamação. Na sequência, estão violência física, com 29%; psicológica, 21%; patrimonial, 7%; e sexual, 1%. 
 
Uma das mulheres já atendidas na unidade foi dona Vera*, 40 anos. A moradora de Ipojuca fez uma denúncia, em abril, contra o ex-companheiro, com quem vivia há uma década. Ela obteve as medidas protetivas – como afastamento e proibição de comunicação por parte do agressor – e aceitou o convite para participar das Audiências de Acolhimento. "Tudo ia bem até que, nos últimos meses, ele vivia me xingando, me chamando de sapatona. Um dia, partiu para dar em mim, agarrar meu pescoço", relembra dona Vera*, que pensou em não fazer a denúncia. "Coragem mesmo, eu não tinha tido. Foi por conta de minha nora que eu vim. Ainda pensei em desistir no meio do caminho, porque eu pensava nos meus filhos, mas não me arrependo, porque, se eu for me arrepender, eu não sei o que poderia me acontecer. Depois do que passei, dou maior apoio a outras mulheres. Se puder vou junto para fazer a denúncia, porque tive muito bom atendimento", completa.
 
Mulher sendo atendida pela equipe psicossocial da Vara de Violência Doméstica e Familiar do Cabo de Santo Agostinho
Acolhimento acontece na presença de profissionais de Psicologia e Serviço Social
 
Quem também aceitou auxílio por meio das Audiências de Acolhimento realizado na Vara da Mulher do Cabo foi Aline*, 31 anos, outra moradora de Ipojuca. "É uma situação ruim. Depois que meu pai saiu de casa e não aceitou a separação de minha mãe, tudo ficou muito difícil. Ele começou a perseguir a gente, chegando a ir ao meu trabalho, me xingando, dizendo que eu não prestava, que eu não era filha dele, que iria colocar fogo em nossa casa. Tudo muito constrangedor. Depois da denúncia, tivemos todo apoio. Aqui em me senti mais acolhida. Não sei o que seria de mim sem esse atendimento", declara.
 
Os relatos das mulheres atendidas na VVDFM do Cabo reforçam a percepção do assistente social Joaquim Pradines Neto, que atua na unidade desde o início das atividades, sobre a necessidade de ações como as já desenvolvidas. "A centralidade das informações prestadas como instrumento propulsor de tomada de decisões a respeito das situações de violência vivenciadas, muitas vezes ao longo de vários anos, ratificam a presença e a obrigação do Poder Judiciário de intervir em situações conflituosas no âmbito doméstico e familiar. Além de compor um espaço de atenção individual e escuta qualificada no que tange aos assuntos concernentes ao tramite judicial, intenta ainda promover uma abordagem na qual enfocamos trabalhar nas usuárias uma perspectiva de desenvolvimento de autonomia e empoderamento gradual e contínuo, que possibilitarão a tomada de decisões inerentes ao rompimento do relacionamento violento", revela. 
 
Fachada do prédio onde funciona a Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Cabo
Prédio onde funciona a Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Cabo de Santo Agostinho
 
Serviço - A Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Cabo de Santo Agostinho está localizada na rua Doutor Manoel Clementino Cavalcante, 96, Centro, próximo ao Fórum da Comarca. O horário de atendimento é das 09h às 18h. Informações através do telefone (81) 31819400.
 
*Os nomes verdadeiros das entrevistadas foram preservados
 
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Texto: Francisco Shimada | Ascom TJPE
Fotos: Alesson Freitas | Agência Rodrigo Moreira