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Programa de combate a automutilação e autolesão em adolescentes é indicado ao Prêmio Innovare 2020

Com o tema Enfrentamento Multidisciplinar do Comportamento Autodestrutivo em Crianças e Adolescentes, o programa da Vara Regional da Infância e Juventude (VRIJ) de Petrolina, no sertão do estado, é uma das cinco iniciativas do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) que concorrem ao Innovare 2020. O principal objetivo do projeto é acompanhar jovens, e seus familiares, que venham a praticar atos como a automutilação e a autolesão, evitando até mesmo o suicídio.

Tudo começou em março de 2017, com alertas emitidos pela mídia nacional quanto à disseminação nas redes sociais do jogo virtual “Baleia Azul”, onde eram sugeridos às crianças e adolescentes desafios que levavam à prática de condutas autodestrutivas. No último estágio, as ações iam se agravando, podendo levar o participante ao suicídio. De acordo com o juiz da VRIJ de Petrolina e autor do projeto, Marcos Bacelar, o intuito foi primar pelo direito fundamental à vida e pelos cuidados preventivos em prol dos adolescentes. “Celebramos uma parceria com as secretarias Estadual e Municipal de Educação e também com a Secretaria de Ação Social aqui de Petrolina. Criamos questionários e distribuímos para os gestores e coordenadores das escolas públicas para assim conhecermos a realidade sobre essa questão do comportamento autodestrutivo nos adolescentes”, esclarece o magistrado.

 Segundo Marcos Bacelar, o trabalho conseguiu se efetivar como uma importante ferramenta de prevenção. “Em relação à evolução do programa nós tivemos resultados muito positivos, com medidas individualizadas para cada caso que monitoramos. Isso fez com que as demandas judiciais que chegavam na VRIJ, com a intervenção do Ministério Público e da Defensoria Pública, fossem extintas. Já que esses adolescentes estavam tendo acompanhamento familiar, psicológico e, em alguns casos até atendimento psiquiátrico”, pontua o magistrado.

O titular da Vara da Infância e Juventude de Petrolina explica que foi criado um protocolo em relação ao tema a partir da Orientação 01/2017, elaborada por ele e por toda a equipe técnica psicossocial que atua na Unidade com relação às abordagens desenvolvidas nas palestras. “Dessa forma nós obtivemos uma significativa redução na quantidade de jovens com esse tipo de conduta. Quando o programa iniciou, em 2017, detectamos 105 jovens. Em 2018 esse número caiu para 41 casos. E em 2019 foram registrados apenas 25 casos. Eu gostaria de frisar que em abril de 2019 foi publicada uma Lei Federal 13.819/2019 que instituiu uma política nacional de prevenção à automutilação e ao suicídio, o que veio confirmar todas as práticas preventivas que já fazíamos aqui em Petrolina desde 2017. Ou seja, o TJPE se antecipou à criação da Lei Federal”, explica.

A gestora da Escola Estadual Joaquim André Cavalcanti, Renata Ribeiro, ressalta que o programa é fundamental para identificar e fazer o correto encaminhamento dos alunos. “Quando detectamos adolescentes com problemas e comportamentos de autodestruição, preenchemos o formulário que recebemos da Vara da Infância e encaminhamos esses jovens para que seja realizado um atendimento prioritário na rede pública de saúde”, explica Renata. A segunda etapa, de acordo com gestora, é realizar a escuta dos adolescentes.

Sobre o aspecto psicológico e emocional, o psicólogo do programa, Marcelo Ribeiro, revela que essas agressões ao próprio corpo não surgem de repente. “Comportamentos desse tipo como autolesão e automutilação não aparecem de uma hora para outra. Têm a ver com a história de vida dos adolescentes, que muitas vezes é marcada por negligência, abandono, violência e preconceitos. São jovens que trazem consigo essas marcas, então trabalhamos junto às escolas, sem retirar a responsabilidade dos pais. Mas a gente também sabe que muitas vezes esses pais são ausentes ou não sabem como lidar com um assunto tão sério”, explica.

Marcelo Ribeiro revela que o espaço de escuta, tanto individual quanto coletivo, é fundamental para trazer aos jovens o sentimento de inclusão. "Nós não abordamos especificamente o tema da automutilação e do suicídio, eles ficam bem à vontade para falar de qualquer assunto que eles queiram. Buscamos temas comuns a qualquer jovem da idade deles, como afetividade, relacionamentos, projetos para o futuro. Então, quando eles falavam sobre amizade e coleguismo, vinha a questão do bullying, do preconceito, da rejeição, e das histórias familiares. Nesses espaços eles são ouvidos, são melhor vistos porque muitas vezes os adolescentes passam por ‘invisíveis’. Por isso nós sempre procuramos fortalecer a rede de convívio deles, que são os vínculos com os professores e colegas”, detalha o psicólogo.

Foi exatamente assim que aconteceu a adolescente Marina*, de 15 anos, que estava passando por um momento difícil. Ela foi atendida pelo Programa de Enfrentamento Multidisciplinar do Comportamento Autodestrutivo em Adolescentes, a partir de uma análise do seu perfil, foi encaminhada para frequentar aulas de Ballet. “Na época eu tinha 12 anos e foi bom porque eu gostava muito do ballet, era uma experiência nova que eu sempre quis fazer. Eu estava feliz em fazer ballet e a rotina dos meus dias fazia eu esquecer das coisas ruins”, relata a jovem.

O juiz Marcos Bacelar chama a atenção para a importância de iniciativas como esta para os adolescentes. “Eu gostaria de elogiar o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) no tocante ao cumprimento da política protetiva escrita na Constituição Federal, em seu artigo 227 e amplamente regulamentada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O TJPE tem tido uma postura inovadora se comparada a de outros tribunais, sempre saindo à frente com dinâmicas transformadoras e dando um apoio incondicional aos magistrados que atuam nessa área”, conclui.

Devido à suspensão das aulas presenciais por causa da pandemia do novo coronavírus, o projeto precisou dar uma pausa nos atendimentos. A coordenadora da Escola Estadual Jornalista João Ferreira Gomes, Uiara Ferreira Farias, explica que o programa precisou ser interrompido temporariamente. “Com a suspensão das aulas, por causa da pandemia, não tivemos como dar prosseguimento ao Programa. Foi um processo de adaptação da escola para as atividades, reuniões e aulas online. Mas assim que as aulas voltarem a ser presencial, vamos retomar com as palestras para os jovens”, esclarece.

Innovare – A premiação, que está em sua 17ª edição, tem como principais objetivos identificar, divulgar e incentivar práticas que contribuam para o aprimoramento da Justiça no Brasil. O Tribunal de Justiça de Pernambuco tem cinco iniciativas concorrendo ao prêmio Innovare 2020.

*Marina é um nome fictício que utilizamos para preservar a identidade da jovem, conforme determina o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

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Texto: Ana Paula Menezes | Ascom TJPE
Imagem: Publicidade e Design | Ascom TJPE