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Abuso e Exploração sexual de crianças e adolescentes: a conversa, o apoio e a denúncia fazem a diferença
Mais de 18 mil registros. Este é o número de denúncias de violações de direitos humanos contra crianças e adolescentes no Brasil somente em termos de violência sexual. Os registros se referem ao período de janeiro a dezembro de 2021 e foram contabilizados pela Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (ONDH/MMFDH). Em 2022, 4.486 denúncias já foram registradas no País. Apesar do alto número, muitas denúncias não são notificadas, já que a manipulação e o medo impostos pelos (as) agressores (as) imperam nas pessoas que sofrem esse tipo de violência, principalmente nas crianças e nos adolescentes. Para chamar a atenção e alertar a sociedade para o combate a esse tipo de violação, a data 18 de maio foi instituída pela Lei n. 9.970/2000, como o Dia Nacional do Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes.
A coordenadora da Infância e Juventude, a magistrada Hélia Viegas, ressalta a importância de campanhas esclarecedoras e incentivadoras da denúncia e combate ao abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes. “O abismo social em que vivemos e que reflete a desestrutura social em inúmeras famílias, que geram inúmeras situações de violações aos direitos infanto-juvenis, inclusive com a banalização da exploração sexual e violência física de crianças e adolescentes no nosso país muitas vezes, vulgariza a percepção da sociedade que a exploração sexual do público infanto-juvenil e, portanto, de adolescentes é crime e deve ser denunciado”, afirma.
Atualmente, no Brasil, o Código Penal (CP), o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei n. 13.431/2017 fazem referência ao abuso e à exploração sexual, que são tipificados como crimes pelo CP com pena que podem chegar a 30 anos de prisão. No abuso, a vítima é usada para satisfazer o desejo sexual das pessoas responsáveis pela agressão, por meio de ameaça ou sedução, podendo haver o contato físico ou não. Já na exploração sexual, há uma relação de troca, seja financeira, de favores ou de presentes, podendo também compreender o incentivo à prostituição, à pornografia infantil, à escravidão e ao turismo sexual.
De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) 2019, que ouviu cerca de 188 mil estudantes com idade entre 13 e 17 anos e foi divulgada em setembro de 2021, um a cada sete brasileiros (as) já sofreu algum tipo de violência sexual ao longo da vida e 9% das meninas já foram obrigadas a manter relação sexual contra a vontade. Ainda segundo o questionário, 14,6% dos(as) adolescentes entrevistados(as) disseram que já foram tocados, manipulados, beijados ou passaram por situações de exposição de partes do corpo alguma vez contra a vontade. Deste número, as meninas foram as que mais indicaram este tipo de violência, correspondendo a 20,1% contra 9% dos meninos.
Devido à falta de diálogo sobre o assunto na sociedade, seja na família ou na escola, muitas crianças e adolescentes participam de atividades que violam sua dignidade. Muitas delas, inclusive, sequer percebem a situação abusiva às quais estão sendo submetidas, pois como estão em desenvolvimento não possuem a devida maturidade. Por isso, um dos passos mais importantes para combater esse tipo de violência é conversar sobre o tema, utilizando o entendimento adequado para cada idade.
“Na família, como ação preventiva, assim como se ensina às crianças sobre várias coisas ou situações que podem significar risco a sua segurança, também é importante que algumas informações, orientações sejam dadas a elas desde muito pequenas, sem precisar adentrar muito no tema, pois não vamos conversar sobre questões mais aprofundadas da sexualidade com uma criança de 2, 3, 4 quatro anos de idade”, explica a assistente social do Depoimento Acolhedor do TJPE, Andréa Paiva. De acordo com ela, pode-se ensinar o nome das partes do corpo, conforme o nível de compreensão, o nome das partes íntimas e que estas são partes privadas do corpo de cada pessoa, orientando a criança ou o (a) adolescente a contarem a um adulto/pessoa de confiança se alguém tocar nestas partes. A mesma orientação deve ser dada às crianças e adolescentes para situações em que alguém peça que elas a toquem, assim como se pedirem segredo sobre algo que tenha acontecido.
Assim como o diálogo, outro fator muito relevante é o apoio à pessoa agredida, que precisa sentir segurança, por parte de quem a escuta, para que se sinta à vontade em contar a agressão que está sofrendo. A assistente social destaca a importância de observar mudanças nos padrões de comportamentos dos(as) adolescentes e crianças. “Ao perceber os sinais e sintomas é importante intervir de forma protetiva, colocando-se à disposição da criança ou adolescente para acolhê-lo(a) e ajudá-lo(a), tendo muito cuidado ao conversar com a vítima, caso ela revele a violência sexual, evitando-se perguntas sugestivas, constrangedoras, que emitam juízos de valor”, esclarece Andréa. “Tendo indicativos de ocorrência da violação de direitos, é importante que os órgãos competentes sejam acionados, pois existem profissionais capacitados para esse atendimento. No entanto, é relevante que as ações interventivas sejam feitas de forma adequada, discreta, sem expor a criança/adolescente, com foco na proteção e obedecendo aos normativos legais vigentes”, completa.
Além da questão sexual, é preciso ressaltar o comprometimento psicológico sofrido por essas crianças e adolescentes que muitas vezes se sentem culpados (as) e envergonhados (as), pois acreditam que fizeram algo que contribuísse para a situação. É imprescindível salientar que o comprometimento psicológico vai muito além da culpa e da vergonha, já que o abuso e a exploração sexual trazem consequências para a vida adulta como a dificuldade de ligação afetiva e amorosa; dificuldades em manter uma vida sexual saudável; tendência a sexualizar demais os relacionamentos sociais; e dependência de substâncias lícitas e ilícitas, por exemplo.
Tão fundamental quanto o diálogo sobre a violência e o abuso sexual, e o apoio, é a denúncia. É através desta última que os casos são devidamente registrados e os (as) agressores (as) são julgados (as) e punidos(as). A coordenadora da Infância e Juventude, Hélia Viegas, destaca a essencialidade da denúncia. “Punir os agressores e abusadores, inclusive para desestimular futuros abusos e práticas de exploração sexual. Além disso, a denúncia e a responsabilização dos agressores a partir dessas denúncias também é um instrumento para coibir tais violações”, explica a magistrada.
O dia 18 de maio foi escolhido como o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes em memória a Araceli Cabrera Crespo. Ela foi raptada, drogada, estuprada e morta no dia 18 de maio de 1973, aos oito anos de idade, por jovens da classe média alta da cidade de Vitória, no Espírito Santo.
Confira algumas dicas para combater e prevenir o abuso e o assédio sexual:
Observe o comportamento da criança com outras pessoas;
Mantenha um diálogo educativo e sincero com a criança;
Mostre que você acredita nela e que não precisam existir segredos entre vocês;
Dê todas as informações possíveis, respeitando a fase de desenvolvimento e o nível de compreensão de cada criança;
Utilize recursos lúdicos para falar sobre o assunto (livros, filmes, músicas);
Ensine o nome das partes do corpo, dizendo quais são as partes privadas;
Indique os tipos de brincadeiras, toques e carinhos permitidos e proibidos;
Explique sobre os tipos de violência;
Diga a quem a criança deve pedir ajuda ou denunciar a violação de um direito;
Controle os sites e as redes sociais que a criança/adolescente acessa, bem como os vídeos a que assiste;
Procure conhecer as brincadeiras, pois elas podem ter algum caráter abusivo;
Diga a criança que ninguém deve fotografar suas partes íntimas;
Crie uma palavra “código” para a criança usar quando se sentir insegura ou com medo.
Saiba como abordar a educação sexual de acordo com as idades:
Entre 18 meses e 3 anos – ensine o nome das partes do corpo;
Entre 3 e 5 anos – converse sobre as partes privadas do corpo;
Após 5 anos – oriente a criança sobre a sua segurança pessoal e alerte sobre as principais situações de risco;
Após 8 anos – inicie a discussão sobre os conceitos e as regras de conduta sexual aceitas pela família e forneça informações básicas sobre reprodução humana.
Como denunciar:
Disque 100 – Vítimas ou testemunhas de violações de direitos de crianças e adolescentes podem efetuar a denúncia através do Disque 100, serviço do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. A ligação é gratuita, funciona 24 horas e pode ser feita de qualquer parte do Brasil, todos os dias da semana. Também é possível realizar a denúncia pelo site. Nos dois casos há a possibilidade do anonimato.
Conselho Tutelar – Deve ser acionado nos casos de violência, inclusive por familiares, de ameaça ou humilhação por agentes públicos, e de atendimento médico negado. O Conselho Tutelar é um dos órgãos de proteção e também recebe denúncias de violações dos direitos das crianças e adolescentes.
Disque 180 – Em casos de violência contra mulheres e meninas, seja violência psicológica, física, sexual causada por pais, irmãos, filhos ou qualquer pessoa. O serviço é gratuito e anônimo.
Polícias – A Polícia Militar deve ser acionada em casos de necessidade imediata ou de socorro rápido. O número 190 recebe ligações de forma gratuita em todo o território nacional. Também é possível acionar as Delegacias Especializadas de Proteção à Criança e ao Adolescente. A Polícia Civil e a Rodoviária podem ser acionadas através dos números 197 e 191, respectivamente.
Safernet Brasil – A rede recebe denúncias de cyberbullying e crimes realizados em ambiente online. As denúncias podem ser feitas por meio do site https://new.safernet.org.br/
Ministério Público - Os promotores de Justiça são fortes aliados do movimento social de defesa dos direitos da criança e do adolescente. Todo Estado conta com um Centro de Apoio Operacional (CAO), que pode e deve ser acessado na defesa e garantia desses direitos.
Proteja Brasil – O aplicativo gratuito permite a denúncia, a localização dos órgãos de proteção nas principais capitais e traz informações sobre as diferentes violações. As denúncias são encaminhadas diretamente para o Disque 100. O aplicativo também recebe denúncias de locais sem acessibilidade, de crimes na internet e de violações relacionadas a outras populações em situação vulnerável.
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Texto: Cláudia Franco | Ascom TJPE
Arte: Núcleo de Publicidade e Design | Ascom TJPE