Notícias

Auxiliar de cozinha ofendida com termos racistas em ambiente de trabalho receberá indenização de R$ 10 mil

Imagem de mão segurando uma caneta diante de um texto jurídico. No topo da página, há um ícone de uma balança como sinônimo de equilíbrio, palavra que sempre é associada a Jusitça.

A 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) condenou, de forma unânime, um cozinheiro a pagar indenização de R$ 10 mil a título de dano moral para uma auxiliar de cozinha por tê-la ofendida com comentários obscenos e racistas enquanto trabalhavam em um restaurante, localizado no bairro de Santo Amaro, no centro do Recife. As ofensas ocorreram na frente de outros funcionários durante horário de trabalho no ano de 2015. O órgão colegiado julgou a apelação 0028282-84.2018.8.17.2001, interposto pela vítima ofendida, no início do ano, em 31 de janeiro de 2024. O relator do recurso foi o desembargador Gabriel de Oliveira Cavalcanti Filho. Também participaram do julgamento os desembargadores Antônio Fernando Araújo Martins e Marcio Fernando de Aguiar Silva.

A condenação na esfera cível foi a segunda do mesmo réu. Na esfera penal, o mesmo fato foi julgado como injúria racial e o réu foi condenado a dois anos de reclusão no processo 0014593-27.2016.8.17.0001, com trânsito em julgado em 18 de novembro de 2020. Inicialmente houve condenação em sentença da 6ª Vara Criminal da Capital. Em seguida, a 2ª Câmara Criminal do TJPE julgou a apelação do réu e manteve a condenação, reduzindo apenas a pena inicial, que tinha sido de 2 anos e 8 meses de reclusão e pagamento de 100 dias-multa.

Nos autos da ação criminal e da própria apelação cível, constam provas de que o réu ofendia, constantemente, a funcionária de quem era superior, com termos racistas, além de outros palavrões e palavras de baixo calão. Isso tudo ocorria diante de outros funcionários do restaurante, ferindo a dignidade e o decoro da vítima.

De acordo com o desembargador Gabriel de Oliveira Cavalcanti Filho, a condenação na esfera criminal já transitada em julgado é prova suficiente dos fatos e da dor sofrida pela vítima. “Não cabe mais qualquer discussão em relação ao dever de J. M. D. P. indenizar a ofendida M. D. C. S., pois a sentença penal condenatória, por si só, é suficiente para provar os fatos trazidos na inicial, razão pela qual tenho como preenchido o primeiro requisito. Em caso como o dos autos, em que houve injúria racial, tenho como certo que o dano sofrido pela apelante é presumido, isto é, in re ipsa, pois o fato por si só já é suficiente para demonstrar a dor vivenciada pela vítima. Aliado a isso, o Código Penal traz o dever de reparação civil por parte do ofensor e torna certa a obrigação de indenizar civilmente a vítima por qualquer crime sofrido”, esclareceu o relator no voto.

A Constituição Federal de 1988 e o Código Penal Brasileiro fundamentaram a decisão da 6ª Câmara Cível. “Aliado a isso, o Código Penal traz o dever de reparação civil por parte do ofensor e torna certa a obrigação de indenizar civilmente a vítima por qualquer crime sofrido. Vejamos: Art. 91 – São efeitos da condenação: I – tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime; Ademais, a prática de atos de teor racista é atitude demasiadamente reprovável que deve ser repelida com ímpeto pelo Judiciário. Com efeito, a própria Constituição Federal busca repelir atos ligados à discriminação racial e punir com os praticantes de tais atos, sendo certo que, nos termos do art. 5º, XLII, da CF, o racismo é um dos poucos crimes com previsão de imprescritibilidade no ordenamento constitucional brasileiro. Cabe, portanto, ao Estado, diante de condutas dessa natureza, reconhecer à apelante o seu direito à reparação civil na função compensatória, isto é, por meio de indenização porquanto não é mais possível trazer a vítima para o estado anterior de coisas”, descreveu o desembargador Gabriel Cavalcanti.

O valor arbitrado a título de dano moral levou em conta a gravidade das ofensas. “No caso, ponderando sobre a situação econômica do causador do dano, identifico ser tratar-se de um cozinheiro não se podendo dizer que se trata de uma pessoa de grandes posses. Por outro lado, o grau de culpa se demonstra elevado, não tendo o causador do dano tomado nenhuma providência para diminuir a dor sofrida pela vítima. (....) A situação econômica da vítima se assemelhava à do causador do dano na época do evento danoso porquanto ambos trabalhavam no restaurante onde o fato ocorreu, razão pela qual ela também é uma pessoa de poucas posses. Em casos semelhantes esta Corte de Justiça já se posicionou a respeito, fixando indenização no valor de R$ 10.000,00”, analisou o relator no julgamento.

O desembargador Gabriel Cavalcanti citou, em seu voto, processos julgados no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), com destaque para o recurso especial nº 1829682 SP 2019/0100719-8, de relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, do STJ; a apelação nº 00006936120148171580, de relatoria do desembargador Frederico Ricardo de Almeida Neves, do TJPE; a apelação nº 00030867220188172370, de relatoria do desembargador Bartolomeu Bueno, do TJPE; e a apelação nº 00308720520168172001, de relatoria do desembargador Fábio Eugênio Dantas de Oliveira Lima.

Apelação Cível nº 0028282-84.2018.8.17.2001

........................................................................
Texto: Bruno Brito | Ascom TJPE
Foto: Istock