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No mês em que o ECA completa 30 anos, o TJPE conta a história da adoção de Laurinha

Laura ao completar um mês de vida com os pais, Rozenaide e Lúcio 

“Com ela, a gente vive o hoje, o agora, o amor incondicional, o cuidado, a esperança, a fé em Deus”. A declaração da professora Rozenaide Moreira dos Santos busca traduzir a experiência e o sentimento em relação à filha Laurinha, hoje com 1 ano e oito meses, adotada por ela e pelo marido, o policial Lúcio Albuquerque Pereira, praticamente recém-nascida. A criança nasceu com hidranencefalia, condição caracterizada pela ausência dos hemisférios cerebrais, em que fica preservado o tronco cerebral. A expectativa de vida de Laurinha era de dois meses, segundo prognóstico médico dado na maternidade em que nasceu, no Recife. 

Casada há 24 anos, com dois filhos biológicos, Bruno e Lucas, hoje com 22 e 24 anos, Rozenaide já tinha vivido a experiência da adoção com a filha Maria Rita, hoje com 13 anos, e que veio para a família aos seis anos e oito meses. Mãe de dois meninos, ela revela que, na época, queria uma filha para completar a família. “Maria Rita encheu nossa família de alegria. Linda, alegre, espontânea e cheia de vida. Os meninos a esperaram por dois anos e quando ela chegou achamos que nossa família estava completa. Ledo engano”, conta. A experiência com Maria Rita fez com que ela fundasse um grupo de apoio à adoção com três amigos e se familiarizasse com o mundo adotivo.

No grupo, ela conta que se tornou mais sensível às crianças que buscam uma família e decidiu adotar mais um filho. Dessa vez, ampliou o perfil para criança com necessidades especiais, mas nunca havia imaginado um perfil como o de Laurinha. “Aprendi que todas as crianças merecem ter uma família. Em nossa conversa com Deus, deixamos claro que a criança que Ele mandasse seria nosso filho porque acho que quem escolhe os filhos não são os pais, mas Deus”, acredita. 

O primeiro contato com a imagem e a história de Laurinha para Rozenaide veio através da pedagoga da Vara da Infância e Juventude de Olinda, Alexsandra Rabelo. A profissional ligou para Rozenaide após o caso ser informado pela juíza da 1ª Vara da Infância e Juventude de Olinda, Laura Simões. Já sabendo da opção do perfil que Rozenaide descreveu e como a bebê não tinha pretendentes à adoção com esse perfil no cadastro, Alexsandra ligou para ela e contou a história de Laurinha, falou do diagnóstico, da expectativa de vida da menina, segundo os médicos, e enviou uma foto da criança. 

Na foto, Laura aparecia com uma sonda oral. Com a foto no celular, Rozenaide pediu ao marido que passasse na escola em que trabalha para mostrar a imagem da bebê e conversar com ele. “Quando ele chegou, fui logo dizendo: 'Olha a nossa filha, Lúcio!' Ele olhou bem para a foto e perguntou o que ela tinha. Expliquei a condição. E perguntei: ‘Vamos ficar com ela’? Ele respondeu: ‘Sim’. E perguntou: ‘É para ir buscar agora?’ Sorri e disse: ‘Não. Ela está internada e temos que esperar sair a documentação dela para gente ir buscá-la’. Então, ele falou: ‘Deixa eu ir trabalhar, qualquer coisa você liga para mim que a gente vai resolver’”, relembra. 

Para que Laurinha fosse para a casa com os pais, a juíza Laura Simões concedeu a guarda provisória da criança ao casal e quando saiu a destituição do poder familiar da menina, Rozenaide e Lúcio entraram com o processo de adoção. A magistrada conta que tomou conhecimento da história da criança por meio de uma Organização Não-Governamental que apoia mulheres que não desejam abortar e ouviu o depoimento da mãe biológica através do Programa Acolher do Tribunal de Justiça de Pernambuco. A iniciativa apoia as gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção encaminhando-os à Justiça da Infância e Juventude. 

Após ouvir a história de Laurinha e colher o depoimento da sua mãe biológica, a juíza falou com a equipe psicossocial para buscar um casal cadastrado do Sistema Nacional de Adoção que aceitasse adotá-la, pois as instituições de acolhimento do município não teriam como cuidar de um bebê que precisasse de tanta assistência. 

Hoje, a juíza revela que um dos pontos que mais chamou a sua atenção para o caso foi a doação do casal à criança desde o primeiro momento em que souberam da sua história. “O casal não achou que ela viveria mais tempo, porém movidos por um amor incondicional, resolveram cuidar dela e amá-la pelo tempo que Deus permitisse a eles. Vejo os pais de Laura como pessoas que buscam o melhor para ela e se dedicam demais a todas as terapias de que ela precisa. Ela é amada por todos da família”, afirma a juíza. 

Rozenaide descreve o que a impulsionou a adotar Laurinha: “O que nos foi dito é que ela precisava de uma família, de colo, de amor, então tudo isso tínhamos para dar. O resto iríamos aprender com o tempo. No começo, a gente celebrava mais um dia, não foi hoje. Amém! Os dias foram passando e nada do que os médicos disseram de prognóstico se concretizou, que ela ia ter muitas convulsões, se gripasse morria, porque não saberia tossir nem espirrar e ela conseguia fazer tudo isso. Com 24 dias já tinha sido possível tirar a sonda e dei a chupeta pra ver se ela pegava, e ela pegou divinamente, a coisa mais linda do mundo, a partir daí eu pensei: ‘Minha filha quer viver’. Ela apresentava um desenvolvimento muito bom para seu diagnóstico e os médicos também começaram a investir nela. Encaminharam para fisioterapia e outras terapias motoras e ela foi crescendo”, afirma. 

Segundo Rozenaide, a filha passou a fazer fisioterapia motora, terapia ocupacional, sessões de fonoaudiologia e de estimulação visual e também hidroterapia. Com a pandemia pelo novo coronavírus, algumas terapias puderam ter continuidade de forma remota, outras foram paradas para ela não correr o risco de contrair a Covid – 19. Os médicos hoje não fazem nenhum prognóstico sobre a expectativa de vida de Laurinha, apenas dizem que ela siga com as terapias, pois está se desenvolvendo bem. O diagnóstico de Laura se confirmou por meio de tomografia computadorizada quando ela tinha quatro meses e também aos dez meses, quando teve uma convulsão. 

“Com as terapias, minha filha está quase sentando, já consegue ficar de pé com ajuda e no parapodium, que é um aparelho que auxilia a criança a ficar na posição vertical. Ela interage bem, conhece todos da família e também as terapeutas, come tudo machucado. Mas precisa de terapias mais específicas e aparelhos como andador e um parapodium melhor, mais confortável e funcional. E estou correndo atrás para oferecer melhores condições de desenvolvimento de vida a minha filha”, revela Rozenaide. 

Laurinha no aniversário de um ano

As evoluções de Laurinha encantam também o pai. Lúcio procura resumir o que sente em relação à filha e ao seu desenvolvimento diário. “O sentimento que tenho é o mais pleno amor. Um amor incondicional, sem cobranças. E ela retribui esse amor com amor também, pois só ao ouvir minha voz, já se expressa, já abre um sorriso. Ela é realmente nosso presente de Deus, ilumina nossa casa, nos torna encantados.Vibramos com cada conquista sua, por menor que seja para as demais pessoas, para mim é a coisa mais linda do mundo. Ela abrir as mãos, ela sorrir, esboçar uma conversa, ela exigir o colo, qualquer coisa que ela faça é lindo e encantador. Todo o dia para mim e para minha família é importante viver com ela, ter ela conosco. Sofro com ela nas terapias que não gosta. Estou sempre presente na sua vida e corro atrás para oferecer o melhor para minha filha se desenvolver, para ter o melhor que podemos dar. Sou seu pai com todo amor deste mundo”, revela.

O afeto e a cumplicidade parecem também permear a relação de Laurinha com os irmãos. Rozenaide descreve a parceria deles com a nova integrante da família. “A irmã, Maria Rita, me ajuda muito a cuidar dela, coloca para dormir, dá comida, mamadeira, ajuda nas terapias online, brinca muito com ela. Laurinha adora as brincadeiras e as bagunças de Maria Rita. Os irmãos são mais protetores, têm uma relação mais de cuidado com a irmã mais nova. Laurinha é muito amada por todos, inclusive pela minha família extensa, meus pais, irmãos, sobrinhos, pela família de Lúcio também e pelos meus amigos. Desde que nasceu teve uma corrente de amor torcendo por seu bem-estar. Ela tem o dom de conquistar a todos, mesmo sem fazer o mínimo esforço. Laurinha entrou em nossas vidas como um presente de Deus, um presente precioso que Deus escolheu para cuidar até quando ele achasse que fosse preciso”, conclui. 

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Texto: Ivone Veloso  |  Ascom TJPE
Fotos: Cortesia