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O Dia Internacional de Luta contra os Maus-tratos Infantis foi domingo (25/4), mas essa é uma data para ser lembrada todos os dias e por todos. Associado, geralmente, à violência física, os maus-tratos costumam estar relacionados a práticas educativas, principalmente àquelas ligadas à disciplina e à correção para a formação de personalidade e adequação do comportamento. De acordo com dados preliminares da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), mais de 103 mil crianças e adolescentes com até 19 anos morreram no Brasil vítimas de agressão entre 2010 e 2020. Deste número, aproximadamente duas mil vítimas tinham menos de 4 anos.
Para a coordenadora adjunta da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), Carla Malta, o assunto deve ser tratado nos vários âmbitos onde as crianças permeiam, como escolas, consultórios médicos e na comunidade, para que haja o suporte necessário para evitar essa problemática. Ela também destaca algumas formas de maus-tratos infantis e as suas consequências. “Sabemos bem que os maus-tratos acontecem nas várias esferas. Às vezes, são abusos sexuais, emocionais, físicos, até o próprio abandono. Nós percebemos que eles deixam uma marca para o resto da vida nessas crianças e adolescentes”, afirma a coordenadora adjunta.
O maior risco de desenvolver depressão; abuso de álcool e drogas; transtornos do estresse pós-traumático, de personalidade, bipolar, alimentares; tentativas de suicídio e outras desordens psiquiátricas estão entre as consequências das pessoas expostas a traumas nas fases precoces da vida. Estudos científicos também demonstram o impacto na estrutura e no funcionamento cerebral, como no das crianças que cresceram na completa negligência nos orfanatos da Romênia comunista, durante o regime do ditador Ceausescu (1918-1989), que apresentaram menores volumes cerebrais do que crianças não institucionalizadas, e alterações persistentes em áreas cerebrais relacionadas ao humor e às emoções em pessoas que passaram por traumas na infância.
De acordo com os dados do Disque Direitos Humanos (Disque 100), em 2019, foram realizadas 159.063 denúncias de violência intrafamiliar, sendo 55% referentes à violência contra crianças e adolescentes. Delas 38% eram ligadas à negligência, 23% à violência psicológica, 21% à violência física, 11% à violência sexual, 3% à exploração/ao trabalho infantil e 3% associadas a outros agravos violentos. Estima-se que, em 2020, houve um aumento nesses números devido à pandemia, que agravou ainda mais a situação de vulnerabilidade de crianças e adolescentes.
Com o objetivo de prestar um serviço auxiliar de natureza judicial, técnico-especializada e administrativa nos procedimentos de depoimento especial das crianças e dos adolescentes vítimas ou testemunhas de violência, o Tribunal de Justiça de Pernambuco criou, em maio de 2010, o Depoimento Acolhedor. A primeira sala foi instalada no Recife, no Centro Integrado da Criança e do Adolescente (Cica). Atualmente, a instituição possui mais quatro desses espaços localizados nas cidades de Caruaru, Camaragibe, Goiana e Petrolina, além do serviço Depoimento Acolhedor Itinerante.
“Nessas salas, são priorizados o acolhimento e a proteção. Busca-se a humanização da coleta do testemunho infanto-juvenil. Também se respeita as especificidades do desenvolvimento cognitivo, psíquico e emocional das crianças e adolescentes. Nestes locais é possibilitada uma coleta de provas testemunhais mais fidedignas e de maior credibilidade”, explica a gestora do Núcleo de Assessoramento em Tecnologia da Informação - Sala de Depoimento Acolhedor da Capital, Sandra Helena Cavalcanti Barbosa ao falar sobre o formato do atendimento no Depoimento Acolhedor. Graças a esses ambientes, essas vítimas ou testemunhas não precisam ser expostas à sala de audiência tradicional, sendo atendidas em um lugar especialmente projetado para a escuta, livrando-as de situações e/ou perguntas inadequadas constrangedoras que pode vir a ocasionar violações de direitos/revitimização.
De 2010 a 2020, das declarações obtidas na sala de Depoimento Acolhedor do Recife, 79% foram referentes a processos relacionados a estupro, estupro de vulnerável e importunação sexual; 15% crimes de ameaça, injúria, abandono de incapaz, sequestro, cárcere privado, abandono material, tortura, dentre outros, além de ações de suspensão ou destituição do poder familiar, acolhimento institucional, guarda, regulamentação de visitas, quando envolvem suspeita de violência; e 3,8% de lesão corporal e maus-tratos.
Outra iniciativa do TJPE relacionada ao assunto é o Centro de Referência Interprofissional na Atenção a Crianças e Adolescentes Vítimas de Violência da Capital (Criar). Vinculado às 1ª e 2ª Varas de Crimes contra Criança e Adolescente. O setor elabora estudos técnicos com a vítima e seus familiares, além de trabalhar na prevenção da violência contra esse público e atuar em ações de formação. Na sua composição estão psicólogas, assistentes sociais e pedagoga.
“O Criar busca se aproximar das vítimas e seus familiares, podendo ajudar na compreensão da complexidade que é o fenômeno da violência contra crianças e adolescentes. Através dos nossos estudos e de nossas intervenções, é possível oferecer aos magistrados, um subsídio para julgamento do caso. Também é possível fomentar a proteção integral de crianças e adolescentes, entendendo a violência como uma violação dos direitos desses sujeitos”, relata a coordenadora do setor, Eliane Maria Bezerra.
Para ela, a nota técnica sobre os procedimentos que devem ser adotados em casos de agressão contra menores de idade que o Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente (CEDCA) irá publicar em seu site colabora na articulação da rede, no fluxo dos atendimentos e na informação da população em geral, especialmente das vítimas. “Estudos apontam que a informação pode ser uma excelente ferramenta para interdição da violência”, conclui.
Leis e penas – No sistema jurídico brasileiro, atualmente, há legislações específicas relacionadas a esses indivíduos: o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei 13.010/2010, conhecida como “Lei da Palmada” que se relacionam com o tema e há ordenamentos gerais, como é o caso do Código Penal, onde a proteção destina-se a todas as pessoas. Este último prevê detenção de dois meses a um ano ou multa nos casos de maus-tratos sem agravantes. Já em crime de maus-tratos que gerem lesão corporal grave, a pena sobe para reclusão de um a quatro anos. Caso ocorra a morte da vítima, a reclusão é de quatro a doze anos. A pena sofre aumento de 1/3 para maus-tratos praticados contra menores de 14 anos.
Formas para identificar os maus-tratos:
Agressão física – hematomas, vermelhidões, partes do corpo lesionados e fraturas;
Agressão psicológica ou emocional - problemas de sono, na fala, carência afetiva, isolamento social e dificuldades na escola;
Negligência – omissão de cuidados básicos com vacinação, alimentação, educação, higiene, afeto e atenção.
Como denunciar:
Disque 100 – Vítimas ou testemunhas de violações de direitos de crianças e adolescentes podem efetuar a denúncia através do Disque 100, serviço do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. A ligação é gratuita, funciona 24 horas e pode ser feita de qualquer parte do Brasil, todos os dias da semana. Também é possível realizar a denúncia pelo site. Nos dois casos há a possibilidade do anonimato.
Conselho Tutelar – Deve ser acionado nos casos de violência, inclusive por familiares, de ameaça ou humilhação por agentes públicos, e de atendimento médico negado. O Conselho Tutelar é um dos órgãos de proteção e também recebe denúncias de violações dos direitos das crianças e adolescentes.
Disque 180 – Em casos de violência contra mulheres e meninas, seja violência psicológica, física, sexual causada por pais, irmãos, filhos ou qualquer pessoa. O serviço é gratuito e anônimo.
Polícias – A Polícia Militar deve ser acionada em casos de necessidade imediata ou de socorro rápido. O número 190 recebe ligações de forma gratuita em todo o território nacional. Também é possível acionar as Delegacias Especializadas de Proteção à Criança e ao Adolescente.
Safernet Brasil – A rede recebe denúncias de cyberbullying e crimes realizados em ambiente online. As denúncias podem ser feitas por meio do site https://new.safernet.org.br/
Ministério Público - Os promotores de Justiça são fortes aliados do movimento social de defesa dos direitos da criança e do adolescente. Todo Estado conta com um Centro de Apoio Operacional (CAO), que pode e deve ser acessado na defesa e garantia desses direitos.
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Texto: Cláudia Franco | Ascom TJPE
Arte: Núcleo de Publicidade e Design | Ascom TJPE